Estes dois conceitos, o de NORMAL e o de SADIO, estão entre os mais importantes das ciências biológicas e da saúde e o que é mais intrigante: embora muita gente experiente os confunda a própria comunidade científica medico-odontológica tem dado pouca atenção a esse assunto!
Entretanto confundir esses dois conceitos durante uma avaliação de um possível processo patológico na ATM de um paciente, pode levar a uma erro de diagnóstico importante!
Normal é um conceito estatístico bastante usado na pesquisa científica na área da saúde e ciências biológicas, enquanto que sadio é um parâmetro qualitativo de ausência de doença. De uma maneira mais simplista, uma doença que seja extremamente frequente numa determinada população será normal mas não significa que ela deixou de ser uma enfermidade, as pessoas dessa população serão consideradas doentes mesmo que isso seja o normal. Tecnicamente, a expressão normal se refere a um tipo de distribuição estatística (distribuição normal) que assume a forma de um gráfico cartesiano com aspecto de uma campânula de sino. Os eventos ou variáveis que se encontram na faixa central desse gráfico estão mais próximos da média e compõe quase 70% do universo abrangido (tecnicamente 68,26%). Isso significa que se algum evento ocorre com muita frequência ele é aceito como algo normal para aquela população, por exemplo, se medirmos a altura de todas as pessoas adultas de uma aldeia, certamente encontraremos um pequeno número de pessoas bem mais altas que a média, outro pequeno grupo de pessoas bem mais baixas que a média e um grupo maior de pessoas próximo à média. Assim, se a média é, digamos, 1,70 m de altura, pessoas com 1,32 m serão tidas como “baixinhas”, pessoas com 2,0 m serão tidas como muito altas e todas aquelas pessoas que estão um apenas um pouco abaixo ou um pouco acima e 1,70 m serão tidas como normais, por estar próximo à média. Estatisticamente isso dá aproximadamente 68,26% de uma população.
A importância disso para a prática da medicina e odontologia está no fato de que sempre que analisamos um exame ou uma característica do paciente, temos a tendência de comparar com a média para saber se é normal. Agora, se uma doença ocorre com uma frequência alta ela passa a ser o normal, mesmo que continue sendo uma doença. Um dos clássicos exemplos desse fenômeno ocorre em certas áreas da Africa onde a anemia falsiforme é tão comum, mas tão comum, que o normal na população é ter a doença, pois quem não a tem, acaba morrendo de malária. O protozoário que provoca a malária tem dificuldades de se reproduzir nas células do sangue das pessoas que tem esse tipo de anemia, então ao longo dos anos, algumas populações de certos vilarejos começaram a ter muito mais pessoas com a anemia falsiforme. Para essa população é normal ter essa doença, no entanto, isso não torna essas pessoas saudáveis.
Com relação à patologia da ATM, é muito comum eu receber no consultório um paciente que não tem tido melhoras significativas com os tratamentos que tem feito para uma ” DTM muscular”, por exemplo. Uma investigação mais detalhada, frequentemente revela uma série e problemas na ATM que não foram considerados porque foram julgados como “normais”, quando eram, em realidade, patológicos. Isso se deve justamente ao fato de se ter tomado o normal por sadio simplesmente pelos achados na ATM serem comuns (há algum tempo, escrevi um artigo aqui no blog especialmente sobre as DTM´s ditas “musculares”).
Essa confusão de conceitos é extremamente comum na radiologia odontológica, principalmente na avaliação das ressonâncias magnéticas e tomografias da ATM, com lesões iniciais ou com alterações de forma, que são muitas vezes chamadas de variação da normalidade. Tais variações da normalidade podem muitas vezes ser, em realidade, patológicas. Por este e tantos outros motivos que, normalmente (não resisti ao trocadilho! risos), você verá em diferentes artigos desse blog, eu me referir à Patologia da ATM quando o assunto for sobre saúde e doença e Disfunção da ATM, quando eu estiver falando das sequelas que essas doenças produzem no funcionamento da ATM.
Portanto, é bom ter bastante consciência de que o normal nem sempre significa que esteja tudo sadio, pois na ATM é relativamente comum haver problemas.
Fique esperto!
NORMAL vs SADIO em outras esferas:
Blog: Comportamentos Diferentes
Blog: Kurioso
Normal vs Sadio (em inglês)
[…] uma publicação passada, postei as diferenças entre “normal” e “sadio” (não deixe de ler sobre essa diferença!), que muitas vezes leva a uma confusão de diagnóstico. […]
[…] a maneira de se entender as disfunções da ATM, como por exemplo a diferença entre normal e sadio, que acarreta uma interpretação errônea entre variações normais e patológicas da anatomia e […]
[…] Normal vs Sadio: o cuidado ao se avaliar a ATM […]
[…] óssea, embora, nessas circunstâncias, o formato do côndilo mandibular esteja, normalmente, deformado por uma artrose. Assim, se houver algum movimento, certamente será uma falsa anquilose […]
Em março do ano passado, cai da escada com a boca aberta. No inicio sintia dores esporadicas e tinha dificuldade. Agora, estou com 15 anos e dores diariamente. Umas duas vezes por semana, mais ou menos, tenho crises de dor terriveis.
Juro que não sou fresca.
Já fiz ressonacia e deu “Luxação anterior dos discos articulare bilateralmente sem recaptura com abertura da boca, com irrugularidades degenerativas dos contilos mandibulares bilateralmente”. Tenho dificuldade para fechar a boca. Faço acumputura, fisioterapia e RPG. Tomo MUITOS remedios.
O que o senhor recomenda?
Obrigada.
Vanessa, te respondi no outro tópico (sobre remédios e ATM).
Atenciosamente,
Marcelo Matos
A primeira vez que li sobre essa distinção foi em um artigo chamado “O que é normal em sexualidade” e exemplifica bem como a psiquiatria encara esta distinção entre “normal” e “sadio” no campo da sexualidade.
Ele pode ser lido no link abaixo:
http://www.psiqweb.med.br/site/?area=NO/LerNoticia&idNoticia=175
Abraços!
Valeu pelo link! Bom texto!
Compreender as diferenças entre esses conceitos de normal e sadio é uma necessidade de toda a ciência contemporânea. Ainda bem que aqui e ali, aos poucos, várias áreas estão se atentando para isso.
Abraço,
Marcelo Matos.
OBS: Vc ainda está me devendo um texto sobre as redes sociais e a área de saúde… rsrsrrs